Uma das maiores tragédias registradas no Brasil completa 25 anos nesta quarta-feira (9): a tragédia do Circo Vostok. Naquela tarde de domingo, o garoto José Miguel dos Santos Fonseca Júnior, de 6 anos, foi arrastado e devorado por um dos cinco leões que estavam na jaula, durante uma apresentação.
O menino e a família foram ao circo, que estava instalado no terreno do Shopping Guararapes, em Jaboatão, no Grande Recife. Ao passar perto de uma das grades, um dos animais, Bongo, de 220 quilos, arrastou a criança, na frente de uma grande plateia, com quase 3 mil pessoas, deixando todos aterrorizados.
O leão só soltou o corpo do menino quando policiais militares chegaram e começaram a disparar tiros. Quatro animais foram mortos e levados para a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).
Na instituição, ficou constatado que eles não tinham ingerido alimentos. Não foi comprovado, no entanto, que os leões atacaram a criança devido à fome. O sobrevivente acabou sendo levado para o zoológico e morreu anos depois.
Na época do ataque,o pai de Júnior, o garçom José Miguel Fonseca, contou que a tragédia aconteceu durante o intervalo da apresentação. Ele e os dois filhos queriam tirar fotos dos cavalos, em um cercado fora do picadeiro.
O apresentador autorizou a foto e indicou o caminho. Eles seguiram e, na volta para o picadeiro, passaram ao lado da jaula dos leões. Foi quando um dos cinco leões avançou e puxou o menino das mãos de Fonseca. “Minha menina viu o irmãozinho ser arrastado”, afirmou o pai, ainda no dia da tragédia.
Testemunhas contaram que o leão colocou as duas patas para fora da jaula, puxou o menino para dentro, abocanhou a cabeça e balançou o garoto. Aí, os outros leões o atacaram. A força com que o leão o puxou chegou a envergar as grades da jaula. O espaço entre uma barra e outra era de 10 centímetros.
O menino, depois de agarrado, foi arrastado cerca de 30 metros por um corredor de aço, até uma caçamba de caminhão também gradeada.
A Polícia Militar chegou ao local uma hora depois do ataque. Primeiro, tentou afastar os leões do corpo do menino, dando tiros para o alto. Como eles não se afastavam, a polícia atirou em dois deles, que acabaram sendo mortos.
Horas após o ataque, houve um tiroteio. Dois dos três leões que estavam isolados em um compartimento dentro da jaula estouraram a grade e voltaram a atacar o corpo.
A polícia interveio e atirou com revólveres e fuzis contra os animais. Os dois morreram. Houve correria e um dos policiais ficou ferido ao tropeçar em uma grade.
A perícia técnica constatou que o vão da grade da jaula, que era de 10 cm, abriu para 16 cm com a força do leão.
Consequências
Logo depois da tragédia, foi aprovado projeto de lei que proibia a apresentação de animais selvagens nos circos que se instalarem em Pernambuco. Outros Estados também adotaram a medida.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, em 2018, que a empresa responsável pelo evento, Sissi Espetáculos (Circo Vostok e as responsáveis pela locação do circo, a empresas OMNI e Conpar Empreendimentos e Participações Societárias, proprietárias do shopping, responderiam de forma solidária pelo dano.
A condenação foi fixada pelo TJ de Pernambuco em R$ 1 milhão, mas foi reformada pelo STJ com base no “princípio da razoabilidade e nos parâmetros geralmente adotados”. Os pais de Júnior ganharam na Justiça o direito a uma indenização de R$ 275 mil, por danos morais e materiais.
Na época, a Instituto Médico Legal (IML) concluiu que houve negligência e falta de segurança do circo. O homem que trabalhava como tratador dos leões foi indiciado por homicídio culposo (sem a intenção de matar).
A administração do circo garantiu que assumiria a responsabilidade pela tragédia, mas o circo já não existe.
O processo penal prescreveu. É que a família Vostok viajou, logo depois da tragédia, para os Estados Unidos.
Sabotagem
Três dias após da tragédia, o então dono do circo Vostok, Alexandre Vostok, disse que o ataque poderia ter sido provocado por “sabotagem”.
Segundo ele, uma rixa entre o domador Claudinei Pires da Rocha e um auxiliar pode ter levado o ajudante a liberar os leões para a jaula do palco enquanto o menino passava ao lado da grade.
Em depoimento à polícia, o ajudante Clóvis Santos, negou ser o responsável pelo acidente. Vostok disse que não havia falhas no circo, mas admitiu que poderia ter havido negligência. (Foto: Alcione Ferreira/DP).