Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, está perto de fechar as portas

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Até o fim do ano, o Parque Nacional da Serra da Capivara pode sofrer um golpe pesado. A Fundação Museu do Homem Americano (Fumdham), parceira do governo federal na manutenção da unidade, prepara-se para fechar as portas. Em 2014, seus cofres receberam apenas R$ 860 mil, verba insuficiente para zelar pela infraestrutura que sustenta o acesso e a pesquisa em mais de mil grutas rupestres, dispersas por 130 mil hectares no interior do Piauí. Nem o status de Patrimônio Cultural da Humanidade assegurou a entrada de recursos. Se a penúria significar uma ameaça às cavernas pré-históricas, o título atual poderia mudar para “patrimônio em perigo”.

Pouco tempo atrás, a equipe de Niède Guidon, de 82 anos, que preside a fundação, contava com 270 funcionários. Hoje, são 50. Segundo a arqueóloga, a demissão dos empregados remanescentes implicaria no pagamento de indenizações. Para isso, seria necessário encerrar as atividades até dezembro.

— Eu não sei mais o que fazer — admite a arqueóloga. — A fundação surgiu em 1986 porque, sete anos antes, o parque foi criado e não havia funcionários do governo federal. A área estava tomada por caçadores e extrativistas. As pesquisas científicas trazem resultados fantásticos, mas os trabalhos não podem ser sustentados sem uma estrutura básica.

No trajeto entre as grutas históricas, há somente um carro da fundação e outro do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) — que, segundo Niède, às vezes precisa de gasolina emprestada. Das 28 guaritas, apenas 12 estão abertas, sendo que oito não têm vigias à noite.

A pena de morte, segundo Niède, foi o êxodo de recursos de compensação ambiental. Poucos anos atrás, eles eram destinados diretamente pelas empresas à fundação. Agora, devem ser levados para o governo federal, que os distribui entre as unidades. A Petrobras, patrocinadora do patrimônio, também provoca insatisfação. De acordo com a coordenadoria de projetos da Fumdham, a empresa comprometeu-se a enviar R$ 1,2 milhão em 2014, mas apenas R$ 400 mil subiram a Serra. Procurada pelo GLOBO, a Petrobras declarou que o contrato é de R$ 1,14 milhão, e que as demais parcelas estão sendo pagas este ano. Entre 1999 e 2014, acrescenta, o valor destinado à Fumdham soma R$ 13,6 milhões.

— Sozinho, o governo federal não tem condições de sustentar o parque — lamenta Niède. — Consultamos empresas internacionais que mostraram como um Patrimônio da Humanidade pode receber até cinco milhões de turistas por ano. Mas só 25 mil chegam aqui, porque o aeroporto mais próximo está a 350 quilômetros de distância. O parque deveria contribuir para o desenvolvimento econômico da região, trazendo hotéis, restaurantes, empregados para o setor de conservação, mas nada disso aconteceu.

AEROPORTO NÃO DECOLOU

O governo do Piauí também tem sua parcela de culpa, segundo a arqueóloga. Idealizado no fim da década de 1990 para incrementar o turismo no Patrimônio da Humanidade, o Aeroporto Internacional da Serra da Capivara ainda não foi inaugurado. A obra tem uma página oficial no Facebook, que chegou a anunciar a inauguração para março de 2014. Agora, a nova data é agosto.

Na Unesco, a situação crítica do parque também provoca preocupação.

— Discutimos com o governo, que precisa se sensibilizar para encontrar uma solução contínua para o parque, em vez de depender de arranjos pontuais no orçamento — conta Patricia Reis, coordenadora de cultura da Unesco no Brasil. — Vemos como há cada vez menos recursos e sabemos que a falta de infraestrutura dificulta a chegada de visitantes. A situação atual pode provocar a vinda de uma equipe de monitoramento internacional da Unesco, que listará recomendações para o governo, e o prazo em que elas devem ser cumpridas. Se não conseguir, trata-se do primeiro passo para que o parque perca o título de Patrimônio da Humanidade.

Embora sofra com condições precárias, o parque continua encantando turistas e pesquisadores. (O Globo).